terça-feira, setembro 21, 2004

no silêncio liberto o grito sufocado no desespero invisível da natureza


Imagem de Edvard Munch

o grito


Nasceu em mim o grito
esmagado
calado
num desabafar moribundo de amor
despertou profundo e partiu
sumiu
na pressa levou com ele
um sorriso constante
pensamentos trancados no peito
a luz
de uns olhos
os meus
que exprimem quando não consigo falar
fiz seguir o destino sem rumo
parei o tempo
num sopro
com rotas traçadas
invisiveis
num céu branco
como espuma,
sem um lamento
fatigada, presa no tempo das nuvens
vencida por sentimentos
e num gemido amargo
quis sair
da preguiça de me sentir vencida
provar a água
que me lava e acaricia
saber sentir
sem me apagar
dentro de ti


onda

domingo, setembro 19, 2004

escuro lamento da noite onde se escuta o uivar do vento



na noite tétrica
vi sombras

vazias

caladas

fechadas

chuva ácida, num miudinho chuvisco

solidão oprimida
de tanto resgatada,

momentos eternos de adiamentos
em sonhos livres e desnudados

linhas de um rosto
entrelaçadas
na brisa de um desejo,

um nunca
presente,

o bater da cabeça
de raiva
nas palavras injustas,

a indiferença
que corre em veias grossas,

vi
desprezo
indiferença injustiçada

dizer não
à fúria de estar

por querer ser o prazer saciado


onda
com palavras abres a porta à noite e transformas-te numa sombra lenta

entropecida nos segredos da voz do mar




bebo o silêncio
saboreio o vento,

sacio a fome com a saudade
respiro o mel da fruta

a ausência é uma forma de vida,
baloiço em palavras

em gestos e vozes
com o mar me perfumo

de flores construo um mundo
onde combato o terror e o medo.

atravesso a noite cinzenta,
como um barco sem rumo

exausta sucumbo lentamente
em imagens desfocadas

entro dentro dos sonhos
onde o amor se revela
em movimentos belos e luminosos

perco-me no sono, perto de um coração
que não consegue tocar-me.

extingo-me nas memórias do tempo
ao longo da costa verde e espessa,
tocada por águas translúcidas

é tarde,
diluí-me no sulco da maré


onda

quinta-feira, setembro 09, 2004

um lugar que pinto na imaginação
imagem

atravessei caminhos na vida
numa obscuridade total

o frio foi meu companheiro
além das sombras e solidão

o rosto não o reconhecia
a imagem foi apagada pelo tempo

algumas traziam consigo a dor

tento lembrar-me dos risos
das árvores verdejantes
do cheiro das flores do campo
dos risos de felicidade,

desperta em mim a alegria,
a saudade é dura

vejo rostos sem lhes saber o nome
rostos desconhecidos

sigo o caminho como se fosse uma ordem
quero voltar atrás
como se alguém me chamasse

olho de quando em vez
apresso o passo na noite

desvio o olhar
nada do que procuro me transforma
ou me traz de volta o que procuro

encosto-me, fecho os olhos
e cansada reconheço uma voz

respondo-te e regresso.


onda

quarta-feira, setembro 08, 2004

lua transparente onde me prendo sem condições



isolo a noite
da lua transparente

desafio a penumbra
caminho suspensa na noite
largando o esquecimento
na chuva, intensa e fria

passo a passo
desvendo os gestos
entorpecidos pelo desgaste,
entro nos sonhos invisíveis da voz do mar

num vento ofegante
sem regresso
chega até mim o ruído das ondas
numa obsessão sonâmbula

gemidos desprendidos,
nos fluxos de uma hipótese de amor
onde me anuncio
em palavras sem cor


onda

segunda-feira, setembro 06, 2004

Pedro da Cunha Pimentel Homem de Mello nasceu em 06.09.1904, no Porto



O Bailador de Fandango

Sua canção fora a Gota.
Sua dança fora o Vira.
Chamavam-lhe "o fandangueiro".
Mas seu nome verdadeiro
Quando bailava, bailava...
Não era nome de cravo
Nem era nome de rosa;
Era o de flor, misteriosa,
Que se esfolhava, esfolhava...
E havia um cristal na vista
E havia um cristal no ar
Quando aquele fandanguista
Se demorava a bailar!
E havia um cristal no vento
E havia um cristal no mar.
E havia no pensamento
Uma flor por esfolhar...
Fandangueiro! Fandangueiro?
(Nem sei que nome lhe dar...)

Tinha seus braços erguidos
Não sei que ignotos sentidos...
- Jeitos de asa pelo ar...
Quando bailava, bailava,
Não era folha de cravo
Nem era folha de rosa.
Era uma flor, misteriosa,
Que se esfolhava, esfolhava...
Que se esfolhava, esfolhava...


Domingos Enes Pereira,
Do lugar de Montedor,
(O bailador de Fandango
Era aquele bailador!)
Vinham moças de Areosa
Para com ele bailar...
E vinham moças de Afife
Para com ele bailar.
Então as sombras dos corpos,
Como chamas traiçoeiras,
Entrelaçavam-se e a dança
Cobria o chão de fogueiras...


E as sombras formavam sebe...
O movimento as florira...
O sonho, a noite, o desejo...
Ai! belezas da mentira!


E as sombras entrelaçavam-se...
Os corpos, ninguém sabia
Se eram corpos, se eram sombras,
Se era o amor que se escondia..


Pedro Homem de Melo
Pecado, Líricas Portuguesas

em predra exausta no encontro da noite



fui pedra
em manhã de frio.


estrela
nos caminhos da infância


verão quente
em arbustos de fogo


frescura
num instante inocente


fui obra
na inteligência humana


lâmpada
duma paixão adormecida


infinito
em certas horas


teoria
de palavras ardidas


fui sonho
de uma loucura com sol



onda



domingo, setembro 05, 2004

arrasto as palavas que fazem eco na alma



desapareço por entre o fumo ....
a névoa que me cega
a onda que me arrasta
o mar salgado
com manchas de sangue verde
um cheiro a maresia
num vento que bate leve
arrastando a corrente
levando as tristezas da vida
os dias mal passados
amenizemos a palavra amor
de momentos inquietos
mas duma lucidez irreversível
entre imagens reflectidas
de um adeus sempre adiado
com palavras enlouquecidas
gritos loucos e roucos
sombras tremidas e frias
percorrem a casa vazia
num rumor longínquo
que atravessa vales rios e colinas
num sopro suave da noite
onde a madrugada se anuncia
num cansaço de memórias

onda - um improviso com alguém

volto a fundir-me inclinada em cada dia que amanhece



4

Amo-te nesta ideia nocturna da luz nas mãos
E quero cair em desuso
Fundir-me completamente.
Esperar o clarão da tua vinda, a estrela, o teu anjo
Os focos celestes que a candeia humana não iguala
Que os olhos da pessoa amada não fazem esquecer.
Amo tão grandemente a ideia do teu rosto que penso ver-te
Voltado para mim
Inclinado como a criança que quer voltar ao chão.

Daniel Faria
Do inesgotável
Dos Líquidos

sexta-feira, setembro 03, 2004

acenava ao vento com palavras que se soltavam dos dedos



Agarrei o Mundo entre os dedos da mão...
Gritei-lhe bem alto a dor da desilusão!


Pintei-o como se fosse um arco-íris...
Tirei-lhe a guerra, a fome, as amarguras da vida!


Gritei-lhe o desespero do frio
da dor, da destruição e revolta!


Tentei ensinar-lhe a usar
o verbo amar e pensar...


Mergulhei-o no abismo
Entre passos incertos.


Em pedaços de gente
Pedi-lhe o momento...


E por um instante o mundo parou


onda

  o teu sorriso no esplendor de uma suave explosão chega a mim o teu sorriso. aflui com emoção e calor, como sonhos mesclados nos en...